NOVA POLÉMICA SOBRE A
AUTENTICIDADE DO SUDÁRIO DE TURIM
Antero de Frias Moreira*
*Médico; membro executivo do Centro Português de Sindonologia
Resumo:
Em finais de Agosto a imprensa anunciou a descoberta de um
manuscrito de cerca 1370 da autoria de um bispo francês filósofo racionalista,
questionando a autenticidade do Sudário de Cristo presente na igreja de Lirey,
tendo como base o culto generalizado de falsas reliquias , promovido por muitos
eclesiásticos dessa época.
Nesta análise é demostrado o valor nulo dessa afirmação,
assim como mais uma vez são abordados e sumàriamente rebatidos outros aspectos
«clássicos» anti-autenticidade utilizados pelos cépticos e invocados pelos
media para tentarem desacreditar o Santo Sudário.
A Polémica:
A «bomba» foi lançada em 28/08/2025 pelo jornal italiano «La
Stampa» com o titulo «Sindone,lo scrito più antico : Serviva a trufare i fedeli» https://www.lastampa.it/torino/2025/08/28/news/sindone_falso_truffa_fedeli-15285599/
Esse artigo afirmava basicamente que um perito da
universidade Católica de Louvain (Bélgica) tinha encontrado um documento
medieval, o mais antigo testemunho sobre o Sudário, que datava de 1370, e que
confirmava que já na Idade Média se sabia que a relíquia não era autêntica.
Outros artigos com teor idêntico se seguiram dos quais
referimos a titulo de exemplos
«The Independent» -«Newly uncovered medieval document adds
evidence that the Shroud of Turin is fake» https://www.independent.co.uk/news/science/archaeology/shroud-of-turin-new-evidence-fake-b2816240.html
CNN Science: «Researchers find oldest written claim that the
Shroud of Turin was faked https://edition.cnn.com/2025/09/04/science/shroud-of-turin-oresme-philosopher
Popular Mechanics: «Historian found a 600 Year –old Document
Declaring the Shroud of Turin a Fraud» https://www.popularmechanics.com/science/archaeology/a65969645/oresme-fraud-shroud-of-turin/
Efectivamente Nicolas Sarzeau, um académico historiador da
Universidade Católica de Louvain-Bélgica publicou na revista «Journal of
Medieval History» o artigo «A New Document on the Appearance of the Shroud of
Turin from Nicole Oresme: Fighting Fake Relics and False Rumours in the
Fourteenth Century» https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/03044181.2025.2546884#abstract
Esse artigo tem como base um excerto de uma obra designada
«Problemata» da autoria do bispo de Lisieux Nicole Oresme, um teólogo e filosofo
racionalista, cerca de 1370, onde ele afirmava que o Sudário de Cristo presente
em Lirey era uma fraude destinada a enganar os fiéis.
Nesse excerto o Bispo Nicole Oresme afirma «…muitos clérigos
enganam outros, induzindo-os a trazer ofertas para as suas igrejas. Isto é claro
por um exemplo da igreja de Champagne (refere-se a Lirey onde estava o Sudário)
onde é dito que estava o Sudário de Nosso Senhor Jesus Cristo, e de muitos
semelhantes que inventaram isto e aquilo»
Nicolas Serzeaud afirma:
« A originalidade da posição de Oresme reside na sua
tentativa de providenciar explicações racionais para fenómenos inexplicados,
quer miraculosos ou prodigiosos, em vez de os interpretar como divinos ou
demoníacos ou devido a uma influência desconhecida (influentia ignota)…»
Concerteza estas noticias lançaram polémica, até porque
várias noticias de teor semelhante repescaram outros factos anti-autenticidade
do Sudário mais ou menos recentes, (referimo-nos nomeadamente ao artigo de
«estudo» da imagem do Sudário de Cicero Moraes, Testes radiocarbono 1988 e
artigos de Walter McCrone) para em conjunto desacreditarem a autenticidade do
Santo Sudário de Turim
Assim sendo, sinto que é minha obrigação esclarecer e repor a
verdade.
Discussão/Esclarecimento
Infelizmente não é a primeira vez que temos conhecimento de
elementos da Igreja a desacreditarem o Santo Sudário de Turim
Em 1900 o sacerdote francês Ulysse Chevalier , académico e
historiador afirmava nos seus escritos que o Sudário de Turim era uma obra
medieval pintada, baseando-se no famoso Manuscrito de Pierre D’Arcis, que teria
sido enviado ao Papa Clemente VII em Avignon.
Existem dois rascunhos desse documento datado de 1389 na
«Colecção Champagne» da Blibiothèque Nationale de France.
Fundamentalmente o Bispo Pierre D’Arcis da diocese de Troyes
teria escrito que cerca de 30 anos antes o seu predecessor Henri de Poitiers
concluiu que o Sudário exposto em Lirey pelo cavaleiro Geoffroy de Charny e sua
esposa Jeanne de Vergy desde cerca 1355, seria uma pintura, e que sabia quem
foi o pintor que a elaborou (sem indicar o nome…)
De acordo com o que foi apurado, essa atitude de carácter
revanchista de Pierre D’Arcis o qual sequer nunca teria visto o Sudário, teria
como base a disputa da posse do Sudário para este ser exibido sim na catedral
de Troyes, a fim de receber as dádivas dos fiéis.
Apesar da sua pretensão, o Papa Clemente VII não decretou a
transferência do Sudário de Lirey para Troyes e não impediu a veneração da
Relíquia.
Posteriormente em 1903 Herbert Thurston, académico jesuíta
racionalista e oponente da espiritualidade, veementemente afirmava num artigo
anti-Sudário que escreveu «The Holy Shroud and the Verdict of History», que o Sudário
de Turim era uma fraude, também com base na tese de Ulysse Chevalier/
Memorandum Pierre D’Arcis.
Hoje sabemos seguramente que o Sudário de Turim não é uma
obra de arte pictórica pois estudos de microscopia, químicos e de
espectrofotometria , espectrometria de massa e FFT (Fast Fourier Transform)
excluem a pintura como forma de elaboração.
No que respeita ao
escrito do Bispo Nicole Oresme um racionalista no seu tempo, não passa de uma
afirmação sem qualquer fundamento.
Se efectivamente nessa época havia o culto das reliquias, e
sem duvida a maior parte eram falsas, o referido eclesiástico nunca viu sequer
o Sudário que estava em Lirey, e generalizou, fazendo uma afirmação sem
conhecimento de causa-trata-se daquilo que se poderá designar «cepticismo
indutivo» portanto o valor da sua
afirmação É NULO
Assim, estas afirmações detractórias de homens da Igreja
carecem de qualquer fundamento científico.
Quanto aos outros
aspectos considerados pelas noticias da Web, e que fazem as delícias dos
cépticos, nomeadamente as conclusões do perito Cicero de Moraes, Testes
radiocarbono 1988 e teoria da pintura de
Walter McCrone já devidamente escalpelizadas, recordamos:
O recente trabalho do Dr. Cicero Moraes perito de
reconstrução facial 3D «Image Formation on the Shroud of Turin-A Digital 3D
Approach» https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=5003510 já abordado em anterior post (02 de
Novembro 2024) foi questionado, bem como em vários artigos de peritos.
Recordamos que esse perito, através de um modelo digital de
um corpo envolto por um lençol concluiu que a imagem do Santo Sudário de Turim
seria uma forma de arte sacra cristã obtida por contacto do lençol com um baixo
relevo.
São ignorados aspectos da microscopia do Sudário, bem como as
características físicas e químicas da imagem sendo assumido que a imagem do
Sudário seria obtida por contacto-ora sabe-se que seguramente a Imagem do
Sudário não se produziu apenas por contacto e as tentativas de reprodução
exaustivamente estudadas pelos cientistas da equipe S.TuR.P. nomeadamente em
baixos relevos foram um fracasso, o mesmo se pode dizer da mais recente
tentativa, a «face» do «Sudário de Garlaschelli» produzida por «frottage» com
acido sulfúrico diluído e corante azul de cobalto num tecido de linho colocado
sobre uma mascara em baixo relevo a imitar a face do Sudário, que cobria a face
de um voluntário.
Além disso não considera as manchas de sangue que foram
impressas no tecido do Sudário previamente à imagem….
Para terminar, esse perito não reproduziu nenhuma imagem
semelhante à do Sudário de Turim, apenas tentou «explicar» a imagem por meios
digitais de uma forma virtual partindo da premissa errónea de que a Imagem do
Sudário de Turim era uma imagem de contacto.
Quanto à teoria do microscopista Walter McCrone de que a Imagem
do Sudário é uma pintura à base de uma têmpera de colagénio e pigmento ocre
vermelho e as manchas sanguíneas teriam a mesma composição com a adição de
vermilião (sulfureto de mercúrio) ela foi completamente refutada pelos estudos
da equipe S.Tu.R.P. e dos bioquímicos Alan Adler e John Heller-definitivamente a Imagem do Sudário não é
uma pintura
Para terminar faltavam os famigerados testes radiocarbono
1988 que dataram uma única amostra do tecido do Sudário de 1260-1390.
Não iremos desenvolver os argumentos de refutação da validade
desses testes, amplamente explicados em múltiplos artigos científicos
publicados em revistas credenciadas.
Recordaremos apenas que NÃO HÁ HOMOGENEIDADE DE DATAÇÃO DAS
SUB AMOSTRAS DOS 3 LABORATÓRIOS ( Tucson Oxford e Zurich), e a amostra recolhida não era representativa do resto do tecido do
Sudário, consoante estudos de microscopia, químicos e de espectrometria de
massa e de cinética da degradação da vanilina.
Para além disso estudos de datação de tecidos por métodos
alternativos apontam para a possibilidade de o tecido do Sudário de Turim ser
do século I -atente-se nos estudos do Professor Giulio Fanti de 2015, e mais
recentemente de 2022, do Professor Liberato de Caro, utilizando o método WAXS
(acrónimo de wide angle RX scattering).
Curiosamente, a imprensa Web que tanto divulgou esse estudo
em finais de 2024 afirmando que afinal o tecido do Sudário era do século I e
portanto o Sudário seria autêntico, vem agora com este argumento absurdo em
grandes parangonas, para negar a autenticidade do Sudário.
Faço um paralelo com o relato evangélico de S. João no qual a
multidão que ovacionou Jesus Cristo no Domingo de Ramos passado dias gritava
«crucifica-O»……..
CONCLUSÃO
Mais uma vez assistimos a exemplos de mau jornalismo de
caracter sensacionalista.
A afirmação de um erudito racionalista do século XIV que
repudiava o culto de relíquias e que tendo chegado ao seu conhecimento que na
Igreja de Lirey estaria aquela que era considerada o lençol funerário de Cristo
com a imagem do Seu corpo e imediatamente afirmou sem sequer o observar, que
era falsa para enganar os fieis, poderá até certo ponto ser compreensível no
contexto da época, não obstante tal conclusão contra a autenticidade do Sudário tem pois um
valor ZERO.
Todavia com todo o conhecimento cientifico sobre o Santo
Sudário adquirido ao longo de mais de 100 anos, utilizar este argumento em
títulos sensacionalistas reforçado por argumentos dos detractores já
devidamente rebatidos é absolutamente lamentável.
Enfim, não resisto a ser mais assertivo e termino com um
conhecido dizer popular «Os cães ladram e a caravana passa».
Nota final: aconselhamos a leitura em língua inglesa, do
excelente artigo sobre este tema, do académico Alessandro Piana intitulado
«Shroud , a Rumour ina Medieval Document Peddled as Proof» https://www.uccronline.it/eng/2025/08/29/shroud-a-rumor-in-a-medieval-document-peddled-as-proof/?fbclid=IwY2xjawMfRWRleHRuA2FlbQIxMQABHpVBJBhcUiFR6P1nnE84O6n4Q3xUjcAlzoW4ZqFzYR-rx9YKSIP63TfojGi9_aem_qJx6h7dgNKuSqes1v9FAdw
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